Para uma abordagem no ensino médio, podemos dividir a eletricidade em três áreas: eletrostática, eletrodinâmica e eletromagnetismo. Nesta disciplina não estudaremos o eletromagnetismo, mas é importante termos conhecimento da sua relação com a eletrostática e a eletrodinâmica. Todos os fenômenos da eletricidade têm relação com os conceitos estudados na eletrostática, sendo a carga elétrica o conceito fundamental. Já falamos sobre isso, mas não custa repetir: carga elétrica cria campo elétrico, que exerce força sobre outras cargas colocadas em suas proximidades. Essa força realiza trabalho, aumentando a energia cinética da carga. O movimento das cargas também pode ser visto a partir do efeito do potencial elétrico, associado ao campo elétrico.
Se essas cargas em movimento estiverem no interior de materiais condutores, podemos observar a existência de uma corrente elétrica, que é o principal fenômeno da eletrodinâmica. No Organizador Prévio 4 você teve uma visão geral de tudo isso. Vamos agora estudar os detalhes e os processos de medida. Mas, antes disso, convém termos em mente a linha do tempo das principais descobertas da eletricidade, até chegarmos ao que sabemos hoje. Uma parte dessa história você estudou nos capítulos anteriores; outra parte vai estudar neste capítulo, ma, a parte mais moderna, que inclui o eletromagnetismo será estudada em outra oportunidade.
Observe a escala do tempo. Entre as primeiras observações sistemáticas da eletrostática, feitas por Tales de Mileto, e a formulação da primeira lei, feita por Coulomb, decorreram mais de dois mil anos. A primeira observação referente ao eletromagnetismo se deu ao mesmo tempo em que ocorreu a descoberta da principal lei da eletrodinâmica, a lei de Ohm, mas foram necessários 40 anospara que as leis do eletromagnetismo fossem concluídas. Isso se deu com a formulação das equações de Maxwell. elétrica. Mas, a história do eletromagnetismo mo derno começa mesmo é com a descoberta do elétron, em 1897. Até então, nin guém sabia ao certo quem eram os responsáveis pelos fenômenos da eletrodi nâmica, sobretudo qual era exatamente a origem da corrente Isso só começou a ficar mais claro com a descoberta do elétron.Três anos depois dessa descoberta, Paul Drude ela borou sua teoria dos metais, que se constituiu no grande salto para os estudos modernos da condutividade elétrica. É o modelo microscópico de Drude que usaremos para explicar os fenôme nos da eletrodinâmica.
O eletromagnetismo contemporâneo se inicia com a junção do modelo de Drude, com o modelo atômico de Rutherford e Bohr e com as descobertas do elétron e do próton. É a existência de prótons no núcleo atômico e de elétrons à sua volta que dá consistência ao modelo de Drude.
O modelo de Drude só vale para a parte central da tabela periódica, que você deve ter estudado nas disciplinas de química. É nessa parte, marcada em azul, que se encontram os metais, sendo cobre (Cu) um dos mais importantes para os estudos de condutividade elétrica.
Depois do surgimento do modelo de Drude, o estudo da física teve muitos avanços, começando pela teoria da relatividade, as pesquisas sobre fenômenos radioativos, a descoberta do próton, do nêutron e da fissão nuclear, a elaboração da teoria quântica, entre outros, até que, em 1947, o transistor foi inventado, dando início à tecnologia eletrônica que alimenta todos os dispositivos digitais atuais.
O modelo de Drude parte do princípio de que em um metal existe uma grande quantidade de elétrons livres. Na visão de Drude esses elétrons livres formam o que ele chamou de gás de elétrons. A partir dessa imagem ele usou os estudos da termodinâmica, especificamente da teoria cinética dos gases para obter os resultados da condutividade elétrica. A matemática envolvida nesses estudos está muito acima do ensino médio. Mas, podemos fazer uma descrição qualitativa dos resultados obtidos por Drude.
Microscopicamente, o que acontece é o seguinte. Cargas elétricas podem movimentar-se sob a ação de campos elétricos e magnéticos, e em diversos ambientes, mas vamos nos concentrar em materiais metálicos condutores, como cobre, níquel, ferro, entre outros. Geralmente os condutores usados em circuitos elétricos são confeccionados com cobre. Então, vamos tratar de elétrons movendo-se em resistores, sob a ação de um campo elétrico provido por uma bateria.
Geralmente o modelo microscópico de Drude é ilustrado em livros didáticos com essa imagem. Na ausência de campo elétrico, os elétronsmovimentam-se aleatoriamente, exatamente como uma molécula de gás. Quando se aproximam do íon positivo, formado pela carga nuclear (positiva) e os elétrons fortemente ligados ao núcleo, os elétrons livres são espalhados em todas as direções. É por isso que o movimento é aleatório. Mas, tem um problema com essa imagem. Como é que os elétrons livres são espa lhados por um íon positivo? De acordo com a lei de Coulomb eles deveriam ser atraídos, e não repelidos pelo íon positivo. Para resolver esse enigma é preciso olhar o modelo de Drude mais detalhadamente.
A imagem abaixo é uma visão mais realista do modelo de Drude. Você aprendeu na química que, no estado normal, o átomo tem no núcleo um certo número de prótons, e em volta desse núcleo orbita o mesmo número de elétrons. Esse número de prótons, igual ao de elétrons, é internacionalmente representado pela letra Z, e é denominado número atômico. Ou seja, a carga nuclear é positiva e igual a Ze, sendo e o módulo da carga do elétron, e=1,6x10-19 C. Desses Z elétrons em volta do núcleo, n podem ser considerados livres, e Z-n são os mais ligados ao núcleo. Os prótons e os elétrons ligados formam um íon positivo, com carga igual a ne. Então, por que o íon positivo espalha o elétron livre? Não deveria atrai-lo?
Para responder essa intrigante questão, precisamos de mais um conhecimento aprendido na química. Comparado com o tamanho total do átomo, o núcleo é minúsculo. Por exemplo, se ele fosse do tamanho de uma bola de futebol e colocado no centro do Maracanã, os elétrons ficariam nas arquibancadas. É isso que permite o espalhamento dos elétrons no modelo de Drude. Quando um elétron livre chega perto do íon, sua primeira e mais forte interação é com alguns elétrons ligados, que estão mais afastados do núcleo. A interação com a carga positiva do núcleo é mais fraca. Portanto, a força de repulsão é maior do que a força de atração.
Veja na tabela periódica da figura 3.2 que o cobre tem número atômico 29. Desses 29 elétrons do cobre, apenas um é considerado livre. Isso parece pouco, mas não é. Com apenas esse elétron livre, o cobre é um dos melhores condutores de eletricidade. Em um pedaço de cobre existem alguns octilhões de elétrons livres. Um octilhão é o número 1 seguido de 27 zeros. É com essa enorme quantidade de elétrons livres que temos que lidar em um circuito elétrico simples.
Se um campo elétrico for aplicado a um condutor, o movimento aleatório dos elétrons livres será alterado pela força do campo elétrico, e esses elétrons passarão a ter um movimento ordenado. Os espalhamentos mencionados acima continuarão, mas a força do campo elétrico fará com o movimento eletrônico seja ordenado, como ilustra a figura 3.3. No caso de um bom condutor, os elétrons livres se deslocam com mais facilidade do que no caso de um mau condutor. Veja que o elétron se move no sentido contrário ao do campo elétrico. Isso é assim por causa da equação (2.5).
Apesar de microscopicamente o movimento aparentar caótico, macrosco picamente há um movimento eletrônico efetivo na figura 3.3, da esquerda para a direita. A imagem desse movimento é similar àquele de uma pessoa que dá dois passos para a frente e um para trás. No final das contas essa pessoa vai andar para a frente. É esse movimento efetivo dos elétrons que dá origem à corrente elétrica.